13 de abril de 2009

COM LICENÇA POÉTICA

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo.
Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Adélia Prado



Sinto-me muitas vezes como a autora do poema, identifico-me principalmente com os seguintes versos: "ora sim, ora não, creio em parto sem dor." E por que estes versos? Porque não há nada mais duvidoso do que o parto sem dor, se não dói na hora do parto, dói a vida inteira e não é dor de desprazer é dor de aprender todo novo dia a ser mãe e assim cumprir a missão de ser desdobrável, de ser mãe, mulher, amante... indefinida e somos nós, mulheres, assim... indefinidas.

Um comentário:

  1. Poesia ousada! Assim como é o seu comentário. Eu não seria digno de fazer tão contumaz poema.Acho que o pedigree se apoderou da minha tristeza.

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Ternura Sempre...