10 de maio de 2009

CARLOS LYRA

Carlos Lyra, carioca de Botafogo. Ronaldo Bôscoli e Paulo Cesar Pinheiro foram seus primeiros parceiros musicais. Quando se auto-exilou em 1964, no México, conheceu o poeta Otávio Paz, Gabriel Garcia Marquez e sua esposa Katherine Lee Riedel. Lyra, destoou da bossa sorriso e amor e reinventou uma bossa voltada para a resistência. Em 1958 compõem Aruanda, em parceria com Geraldo Vandré. Suas composições foram gravadas pelas duas vozes femininas mais afinadas do cancioneiro nacional: Nara Leão e Dolores Duran. Abaixo você confere a fraca interpretação de Ary Toledo para uma das melhores composições do ator, cantor, compositor e dramaturgo Carlos Eduardo Lyra Barbosa.



Comedor de Gilete (pau-de-arara)

(Cantado) Eu um dia cansado que tava da fome que eu tinha
Eu não tinha nada que fome que eu tinha
Que seca danada no meu Ceará
Eu peguei e juntei um restinho
De coisas que eu tinha
Duas calça velha e uma violinha
E num pau-de-arara toquei para cá
E de noite eu ficava na praia de Copacabana
Zanzando na praia de Copacabana
Cantando o xaxado pras moças olhar
Virgem Santa! Que a fome era tanta
Que nem voz eu tinha
Meu Deus quanta moça, que fome que eu tinha...
Zanzando na praia pra lá e pra cá


(Recitado) Foi aí então que eu arresolvi a comer gilete...Tinha um cumpadre meu lá de Quixeramubim que ganhou um dinheirão comendo gilete na praia de Copacabana. Eu não sei não, mas eu acho que ele comeu tanta, mas tanta, que quando eu cheguei lá aquela gente toda já estava até com indigestão de tanto ver o cabra comer gilete. Uma vez eu disse assim prum moço que vinha passando: Ô decente, vosmecê não deixa eu comer uma giletezinha pra vosmecê ver?
"Tu não te manca não, ô Pau-de-Arara?"
"Só uma, que eu ainda não comi nadinha hoje."
"Você enche, ein?"
Aquilo me deixou tão aperreado que se não fosse o amor que eu tinha na minha violinha, eu tinha rebentado ela na cabeça daquele...filho de uma égua!


(Cantado) Puxa vida, não tinha uma vida pior do que a minha
Que vida danada que fome que eu tinha
Mais fome que eu tinha no meu Ceará
Quando eu via toda aquela gente num come-que-come
Eu juro que tinha saudade da fome
Da fome que eu tinha no meu Ceará
E aí eu pegava e cantava e dançava o xaxado
E só conseguia porque no xaxado
A gente só pode mesmo se arrastar
Virgem Santa! A fome era tanta que mais parecia
Que mesmo xaxando meu corpo subia
Igual se tivesse querendo voar


(Recitado) Às vezes a fome era tanta que volta e meia a gente arrumava uma briguinha pra ver se pegava a bóia lá do xadrez. Êta quentinho bom no estômago! Com perdão da palavra, a gente devolvia tudo depois, que a bóia já vinha estragada. Mas enquanto ela ficava quietinha lá dentro, que felicidade! Não, mas agora as coisas tão melhorando. Tem uma dona lá no Lebron que gosta muito de ver é eu comer caco de “vrídrio”. Com isso eu já juntei uns quinhentos merréis. Quando juntar um pouco mais, vou-me embora, volto pro meu Ceará!


(Cantando) Vou voltar para o meu Ceará
Porque lá tenho nome
Aqui não sou nada, sou só Zé-com-fome
Sou só Pau-de-Arara, nem sei mais cantar
Vou picar minha mula
Vou antes que tudo rebente
Porque tô achando que o tempo tá quente
Pior do que anda não pode ficar!

5 comentários:

  1. Poxa, que bacana seu comentário, gostei muito do blog também, PARABÉNS. Sempre bom a gente econtrar espaço principalmente pra poesia e resistência às injustiças na internet, já adicionei aos favoritos! Valeu Cícero, estamos juntos, um forte abraço.

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  2. Que bom que pessoas como vc estão ligadas no nosso blog. Fico feliz... a idéia é difundir a nossa arte/luta pelos muitos cantos do Brasil... e afora, quem sabe!
    Obrigada pela visita, continue acompanhado!
    À proposito.. adorei o teu blog (em especial esse conto do Ari. Muito bom!)

    Abraços fortes de todo o Grupo.
    =D

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  3. Valeu gente. É por aí... A intenção é resitir e transformar essa sociedade que nos desumaniza e tenta nos coisificar como se fossêmos objetos de consumo.

    Avante resistentes!

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  4. Gostei da música e da voz. Mas acho difícil que algum cearense fale Lebron, né? E o sotaque de Quixeramobim? Será que um dia vai ser assim?(rs)

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  5. Concordo. e outra a coisa A interpretação dessa música não é tão fácil assim...

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Ternura Sempre...