19 de abril de 2012

O propósito da arte ou a arte de propósito






                                                                                                                      “Arte é um fenômeno essencialmente social”
(Oliveira Júnior)


Não suporto mais este “ensurdecedor silêncio” que se estende por sobre a humanidade justamente num momento em que gritar é mais urgente. Estou perplexo ao ver a raça humana recriando dissabores e fazendo a próspera ambição brotar como se fosse espiga em tempos de colheita no milharal.
Posso ser intransigente e talvez até irredutível, sobretudo, quando insisto em afirmar que as pessoas, inclusive este que escreve, parecem que estão num invólucro de sonolência e alienação.
Mas de fato, e a história está aí pra confirmar, é que no passado, os artistas, intelectuais e estudantes não se deixavam calar ( e olhe que não é minha intenção ser saudosista) prova disso foram os diversos artistas e movimentos sociais que surgiram no tempo em que nosso povo enfrentou o período de exceção.
Digo exceção, porque na realidade, ainda vivemos numa ferrenha ditadura disfarçada de democracia representativa onde se morre a míngua apesar de tantos avanços tecnológicos, tudo isso, por causa de uma concentração de renda mesquinha que só visa o lucro e não se importa em nenhum instante, em valorizar a vida, seja esta do Planeta ou dos animais que nele habitam.
Todo este cenário de penúria ratificada e covardia dedilhada, faz-me lembrar do genial José Saramago e seu “Ensaio sobre a cegueira”, narrativa que busca criticar a moderna sociedade portuguesa. Considero eu, que esta obra é um pertinente caso a parte, que não figura nos rol das obras apequenadas ou de conteúdo que tenta maquiar a crudelíssima situação em que está submetida a classe trabalhadora através de “lipossociais” em que nem a mais atrevida plástica cirúrgica realizada por Ivo Pitangui ousaria disfarçar.
Interessante notar, neste livro de Saramago é que as personagens não são identificadas pelo seu nome, mas pelo cargo que ocupa no meio social, tal e qual como a gente faz no nosso dia a dia, às vezes sem perceber: “_É Joana. _Quem? _Aquela loirinha que tem trejeitos de homem _ Ah... sei quem é.”  
Assim como as personagens de “Ensaio sobre a cegueira” nós seguimos desmatando florestas, matando sonhos, materializando e consumindo sentimentos, valorizando dores e pensando que  “Há remédio para tudo menos para o Capitalismo.”


Ternura Sempre!

Razek Seravhat


2 comentários:

  1. Prezado Razek,

    Lúcidas suas reflexões e lamentável saber que a indústria cultural vive em função de tentar transformar a arte em mercadoria. Enxergar é um desafio em terra de tantos cegos.

    Gostei da fundamentação a partir da bela narrativa de José Saramago.Interessante observar que no "Ensaio sobre a cegueira", a mulher do médico era a única que podia ver diante de tantos cegos. Isso foi um desafio a mais na medida em que ela não se aproveitou da suposta vantagem para subordinar, tirar proveito do próximo.

    Por outro lado, também nesta mesma narrativa, vemos os cegos que já dominavam a técnica do braile fazerem uso desta para subordinar os demais cegos que não tinham o referido conhecimento, outra metáfora do mundo contemporâneo que nos proporciona uma reflexão acerca da a subversão de valores humanos, em função da degradação do outro.

    Enfim, "em terra de cego quem tem olho é rei?" Enxergar é uma condição humana das mais exigentes e a arte nem sempre é o que nos apresentam nos fatídicos concursos de poesia ou nos programas de auditório dos domingões. Há arte de qualidade sim e enquanto o ser humano for de carne e osso seremos capazes de nos alimentar da arte e fazer da poesia uma forma de reflexão de nossa realidade.

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Ternura Sempre...